sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Espelho, Andrei Tarkovsky



12 Nov 2011 - 21:00,  CCB
M/12 ANOS


PEQUENO AUDITÓRIO - SALA EDUARDO PRADO COELHO


PREÇOS 3€




O que começou, para Tarkovsky, por um plano para uma série de entrevistas, transformou-se numa autobiografia abstrata, onde as memórias do realizador se entrelaçam com as da sua mãe, desenrolando-se no período que antecede a Segunda Guerra Mundial, e onde uma Rússia sumptuosa é evocada pela voz do seu pai, recitando a sua própria poesia elegíaca.

REALIZADOR Andrei Tarkovsky

8, 9 e 12 de Novembro Ciclo Tarkovsky no CENTRO CULTURAL DE BELÉM 


quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Andrea Brandão

Sem título (A4), 2008, papel, dimensões variáveis

A cidade de Tecla, 2007, instalação, areia, água, dimensões variáveis

Auto-retrato com família, 2007, papel, 5 lápis de gráfite e caderno, técnica mista


A primeira vez que vi de perto o seu trabalho foi quando exposemos juntas no espaço Tranquilidade, e confesso que "A Cidade de Tecla" impressionou-me. A ideia do tempo, da ruína, da memória, do vestígio. Andrea chegava de mochila às costas antes da galeria abrir e começava a moldar a areia com água dando corpo efemero a Tecla.

Resolvi escolher três imagens que foram publicadas na revista L'arte junto com traços que nos ajudam a delinear um universo mais próximo ao de Andrea Brandão e da dimensão do desenho dentro da sua obra, "encontrei uma orientação e um espaço de experimentação no desenho, não só no desenho tradicional - do risco sobre o papel - mas no desenho como explosão de sentidos, testando os seus limites." e onde encontramos citadas referências como Fernanda Gomes, Gordon Matta Clark, Maria Gabriela Lansol e Italo Calvino, entre outras. 

Sobre A cidade de Tecla Andrea diz-nos: "Tecla quer ser mas nunca será. É uma cidade que nunca estará acabada. Prevenindo a sua ruína está sempre em construção (...). Testemunhamos o processo de trabalho (a construçao, desconstrução, reconstrução) como uma superfície de tempo." 

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

a arte do meu jardim em mim / a arte de mim no meu jardim












Fonte: L+Arte, nº 81, pág. 81-87, Projecto: A ARTE DO MEU JARDIM EM MIM / A ARTE DE MIM NO MEU JARDIM (1937- Coronado) de Alberto Carneiro.

Mãos dadas

Julgamos que nos libertamos dos lugares que deixamos para trás de nós. Mas o tempo não é o espaço e é o passado que está diante de nós. Deixá-lo não nos distancia. Todos os dias vamos ao encontro daquilo de que fugimos.

Carlos Drummond de Andrade, “Mãos dadas”, Antologia Poética, Lisboa, Dom Quixote, 2002, p.149

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

A rapariga de Amesterdão


Por estes dias retomei o Diário da Etty, uma judia que aos 27 anos começa a escrever em pequenos cadernos quadriculados. Conta-nos da sua paixão pelos livros, pela literatura russa e a língua eslava, o medo de não fazer obra, e o amor por dois homens. Escrevia durante a 2ªGuerra Mundial e durante 2 anos partilha o seu despertar espiritual, as suas dúvidas, a sua intimidade, os medos e o retrato que os seus sentidos fazem do que assiste. Pelo meio são chás partilhados, as lutas com Spier e o seu intenso mergulho sobre si mesma. Etty leva consigo para o campo de concentração três livros, a Bíblia; o livro das Horas e Cartas a um jovem poeta, ambos de Rilke.


"Foi novamente como se a Vida, com todos os seus segredos, estivesse próxima de mim, como se eu a pudesse tocar... E ali sentia-me imensamente segura e protegida. E pensei: «Como isto é estranho. É guerra. Há campos de concentração. Pequenas crueldades amontoam-se por cima de pequenas crueldades. Quando caminho pelas ruas, sei que, em muitas das casas por onde passo, há ali um filho preso, e ali um pai refém, e ali têm de suportar a condenação à morte de um rapaz de dezoito anos.» E estas ruas e casas ficam perto da minha própria casa.
Sei do grande sofrimento humano que se vai acumulando, sei das perseguições e da opressão... Sei de tudo isso e continuo a enfrentar cada pedaço de realidade que se me impõe. E num momento inesperado, abandonada a mim própria - encontro-me derrepente encostada ao peito nu da Vida e os braços dela são muito macios e envolvem-se, e nem sequer consigo descrever o bater do seu coração: tão fiel como se nunca mais findasse..."

Etty Hillesum, Diário
Edição: Assirio Alvim, tradução Maria Leonor Raven-Gomes

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Súmula, Herberto Helder




Minha cabeça estremece com todo o esquecimento.
Eu procuro dizer como tudo é outra coisa.
Falo, penso.
Sonho sobre os tremendos ossos dos pés.
É sempre outra coisa, uma
só coisa coberta de nomes.
E a morte passa de boca em boca
com a leve saliva,
com o terror que há sempre
no fundo informulado de uma vida.

Sei que os campos imaginam as suas
próprias rosas.
As pessoas imaginam os seus próprios campos
de rosas. E às vezes estou na frente dos campos
como se morresse;
outras, como se agora somente
eu pudesse acordar.

Por vezes tudo se ilumina.
Por vezes canta e sangra.
Eu digo que ninguém se perdoa no tempo.
Que a loucura tem espinhos como uma garganta.
Eu digo: roda ao longe o outono,
e o que é o outono?
As pálpebras batem contra o grande dia masculino
do pensamento.

Deito coisas vivas e mortas no espírito da obra.
Minha vida extasia-se como uma câmara de tochas.

- Era uma casa - como direi? - absoluta.

Eu jogo, eu juro.
Era uma casinfância.
Sei como era uma casa louca.
Eu metias as mãos na água: adormecia,
relembrava.
Os espelhos rachavam-se contra a nossa mocidade.

Apalpo agora o girar das brutais,
líricas rodas da vida.
Há no esquecimento, ou na lembrança
total das coisas,
uma rosa como uma alta cabeça,
um peixe como um movimento
rápido e severo.
Uma rosapeixe dentro da minha ideia
desvairada.
Há copos, garfos inebriados dentro de mim.
- Porque o amor das coisas no seu
tempo futuro
é terrivelmente profundo, é suave,
devastador.

As cadeiras ardiam nos lugares.
Minhas irmãs habitavam ao cimo do movimento
como seres pasmados.
Às vezes riam alto. Teciam-se
em seu escuro terrífico.
A menstruação sonhava podre dentro delas,
à boca da noite.
Cantava muito baixo.
Parecia fluir.
Rodear as mesas, as penumbras fulminadas.
Chovia nas noites terrestres.
Eu quero gritar paralém da loucura terrestre.
- Era húmido, destilado, inspirado.
Havia rigor. Oh, exemplo extremo.
Havia uma essência de oficina.
Uma matéria sensacional no segredo das fruteiras,
com as suas maçãs centrípetas
e as uvas pendidas sobre a maturidade.
Havia a magnólia quente de um gato.
Gato que entrava pelas mãos, ou magnólia
que saía da mão para o rosto
da mãe sombriamente pura.
Ah, mãe louca à volta, sentadamente
completa.
As mãos tocavam por cima do ardor
a carne como um pedaço extasiado.

Era uma casabsoluta - como
direi? - um
sentimento onde algumas pessoas morreriam.
Demência para sorrir elevadamente.
Ter amoras, folhas verdes, espinhos
com pequena treva por todos os cantos.
Nome no espírito como uma rosapeixe.

- Prefiro enlouquecer nos corredores arqueados
agora nas palavras.
Prefiro cantar nas varandas interiores.
Porque havia escadas e mulheres que paravam
minadas de inteligência.
O corpo sem rosáceas, a linguagem
para amar e ruminar.
O leite cantante.

Eu agora mergulho e ascendo como um copo.
Trago para cima essa imagem de água interna.
- Caneta do poema dissolvida no sentido
primacial do poema.
Ou o poema subindo pela caneta,
atravessando seu próprio impulso,
poema regressando.
Tudo se levanta como um cravo,
uma faca levantada.
Tudo morre o seu nome noutro nome.

Poema não saindo do poder da loucura.
Poema como base inconcreta de criação.
Ah, pensar com delicadeza,
imaginar com ferocidade.
Porque eu sou uma vida com furibunda
melancolia,
com furibunda concepção. Com
alguma ironia furibunda.

Sou uma devastação inteligente.
Com malmequeres fabulosos.
Ouro por cima.
A madrugada ou a noite triste tocadas
em trompete. Sou
alguma coisa audível, sensível.
Um movimento.
Cadeira congeminando-se na bacia,
feita o sentar-se.
Ou flores bebendo a jarra.
O silêncio estrutural das flores.
E a mesa por baixo.
A sonhar.

In «Ou o Poema Contínuo», Assírio & Alvim, 2001
fotografia Cláudia Ramos

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

João Penalva, CAM




«Bailarino, pintor, actor, escritor, tradutor, gráfico, curador, cineasta e fotógrafo, Penalva é um contador de histórias encartado, o familiar que correu mundo para partilhar aventuras tão deliciosas que só podem ser reais. O árbitro de um jogo nebuloso que nos arrasta para o universo da escrita e da imagem, transformado num lugar único de enumerações e descrições exaustivas. No fim de contas, "claro que é tudo ficção". Podem não ser reais, mas são genuínas.»

Maria Ramos Rosa Silva, in ionline.pt