quinta-feira, 26 de agosto de 2010

CASA-ABRIGO, Circolando



Tomando por pontos de partida as obras de Gaston Bachelard e Louise Bourgeois, chegamos a um conjunto de palavras-chave que nos servem de guia: casas abandonadas, suspensas no tempo, reocupadas pela natureza. Casas que se abriram ao céu, casas que ganharam raízes. Abrigos, refúgios, casulos, ventres. Mulheres-casa-mãe. Fiadeiras e tecedeiras. Aranhas, ovelhas, bichos-da-seda. Fios e novelos. Dobadoiras e teares. Cantos de trabalho. Canções de embalar. Baloiços em sonhos imensos. Sonhos de mar e sal. Sonhos com ninhos de pássaros.
Um concerto-encenado, uma projecção vídeo e várias instalações são os modos que escolhemos para abordar estas temáticas. O cruzamento de várias linguagens artísticas - teatro físico, dança, artes plásticas, música, video - está então na base deste nosso teatro de imagens próximo da poesia. Com uma componente deambulatória, "Casa-Abrigo", tece fortes relações com o espaço que a acolhe. Cada lugar há-de torná-la um acontecimento único. A recriação contínua é, pois, uma das marcas do espectáculo.

...As casas que o tempo fundiu com a natureza são o ponto de partida. Casas com árvores e com pássaros. Casas com terra, chuva e vento. Casas feitas de um tempo suspenso, fora dos dias, próximo da eternidade.
Nelas fomos encontrar um grupo de mulheres que sonha com um fio misterioso capaz de tecer um abrigo para resguardar um mundo feito de luz e de histórias brancas. Um fio capaz de tecer uma casa de paredes maleáveis que nos envolvem e nos aconchegam. Uma casa-ninho, casulo, ventre. Uma casa que nos guarda para sempre "o regaço aquático da nossa mãe".
Começamos por encontrá-las nos seus quartos de sonho. Vestem vestidos feitos com os materiais da casa, pedra, pó e cal. Mulheres eternas, estátuas que respiram. Seguimo-las de quarto em quarto, de sonho em sonho. O percurso leva-nos ao lugar dos seus segredos, dos seus rituais. Um sotão feito de fios, refúgio dos vários instrumentos dos ofícios de tecer.
Ali, despem os seus invólucros de pedra e revelam-nos intacto o seu lado de crianças. É tempo de celebração do novo fio. Fazem soar os seus engenhos tornados instrumentos de música e trazem-nos a memória de um mundo rural antigo.
Comunidade de trabalho e afecto onde o homem está ausente. O fio com inicio do mais fundo de nós será tecido em forma de casulo. A casa-abrigo que nos devolve a paz do berço. Respiramos fundo e obrigamos o mundo a relaxar. Uma golfada de ar que nos enche de branco a cabeça.


Dia 12 e 13 de Março de 2011 no S. Luiz, Lisboa

Fonte: www.circolando.com

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Pavlina e o Dr. Erlenmeyer de João Penalva


Destacando da mostra de João Penalva no Chiado 8 que terminou a 25 de Junho, o "filme" Pavlina, numa exposição coerente e de ambiente museológico denso e profundamente encenado onde um som estranho nos acompanha, numa antecipação do culminar desta exposição, repleta de relações criadas entre dois pólos: um físico, Dr. Erlenmeyer que trabalhou o conceito da base da naftalina e Pavlina uma bióloga reformada que se dedicou ao estudo das traças e que participou numa pesquisa sobre os sonhos de reformados, relatando o seu.
O sonho de Pavlina é apresentado textualmente por meio de um projector analógico, numa sala escura, cujo silêncio é quebrado apenas pelo som da passagem sequencial dos slides, e onde o tempo existente entre um slide e outro aliado à escuridão nos dão a premissa de jogarmos com as nossas memórias criando um universo individual a que a dada altura se junta mais um elemento, um filme estranho, onde nos surge uma traça em grande escala, ao mesmo tempo que um som desconcertante que se assemelha ao de "uma turbina de um avião" emerge, e que nos é familiar, pois era este o mesmo som que ouvimos ao longo do percurso até aqui chegarmos. Desconhece-se a autoria do filme mas a sobreposição do sonho de Pavlina com este perturbador filme aliado ao universo individual de cada um, construído no tempo, fizeram desta instalação o ponto alto da exposição.


imagem: www.articoweb.it

domingo, 15 de agosto de 2010

Sentir a casa, Fiama Hasse Pais Brandão


Sentir a casa, a luz mais densa. Viver agora este contorno
mais do que o de plantas espesso. Temer o espaço,
então, o rectilíneo; (a memória diz: o útero, o gineceu da flor).
É o solstício no corpo, frigidíssimo som entre folhas,
a memória: nesta hora (visual),
ó porta extinguirmo-nos, rememorar.

Fiama Hasse Pais Brandão
Obra Breve

sábado, 7 de agosto de 2010

Canino de Yorgos Lanthimos no Medeia

"Sobretudo queria mostrar como é fácil manipular a percepção que as pessoas têm das coisas e do mundo. Isso serve para uma família, para grupos sociais ou para um país."   Yorgos Lanthimos

domingo, 1 de agosto de 2010

Um Estranho Barulho de Asas, Lenda de Macau


4 de Agosto, 16h30 na livraria Histórias com Bicho.                                                                                

Gianni Rodari e a "arte" de inventar estórias

Gianni Rodari era professor do ensino primário e escritor infanto-juvenil. Como professor e escritor criou uma "gramática" denominada de Gramática da Fantasia, que nada mais é que ensinar às crianças a arte de inventar estórias, são sugeridos diversos exercícios que "espremem" a memória, que brincam com binómios fantásticos, que usam prefixos que dão vida à trivaca, por exemplo, ainda desconhecida para a zoologia ou à biscaneta que escreve a dobrar, ou ainda recordar um jogo difundido em todo o mundo que faz uso da "sintaxe ao acaso", quando por exemplo em vários papelinhos se escreve uma pergunta:

Quem foi?
Onde se encontrava?
O que fazia?
O que disse?
O que disseram as pessoas?
Como acabou?

E cada criança pega num papelinho e escreve a resposta, depois juntas lêm o resultado como se fosse um conto, por exemplo:

"Um morto
na torre de Pisa
fazia meias
disse: quando dá três vezes três?
Todos cantaram o fado
e o jogo acabou empatado."

Dependendo dos exercícios podem-se obter resultados muito estimulantes. Lembrando ainda do jogo surrealista, em que uma criança desenha uma figura e a criança seguinte pega nessa figura para desenhar outra, não com o intuito de completar o primeiro desenho mas o de mudar a direcção, virando-o do avesso. "O resultado final é muito frequentemente um desenho incompreensível, em que não se fixa nenhuma forma, mas todas se atravessam umas nas outras, numa espécie de movimento perpétuo combinatório." Podendo nascer personagens insólitas ou paisagens fantásticas.

Depois viajamos até aos contos populares enquanto matéria-prima, tocando suavemente
nos irmãos Griim, em Andersen ou Collodi, que nos levam por entre contos Alemães num uso primordial da língua, ou por entre a infância de Andersen ou mesmo a história popular toscana.
Foram considerados os libertadores da literatura infantil em relação aos deveres edificantes que lhe tinham conferido. E Rodari vai ensinar-nos como podemos usa-los para criar novas estórias, seja "errando" a conta-las seja contando-as ao contrário ou imaginando o que aconteceu depois, para além da possível "salada" de contos, daqui passamos por entre múltiplas possibilidades criativas que faz deste livro uma peça importante para professores, educadores e pais.





Gianni Rodari 1920-1980, Itália. Publicou a sua primeira obra em 1950. A Gramática da Fantasia é um clássico da literatura pedagógica.